Humildade democrática

O governo lançou o guião para a reforma do Estado em versão draft. Parece que foi aprovado em conselho de ministros, mas tenho sérias dúvidas que alguns ministros sequer o tenham lido... A isso iremos mais tarde.
Achei particularmente interessante a humildade que se instalou no governo e que Paulo Portas parece nos querer disso convencer com «falinhas mansas». Honra lhe seja feita: tem um discurso muito mais fluído e coerente que a esmagadora maioria dos membros do governo, concorde-se ou não com ele.
Mas a verdade é que esta humildade intriga-me. Então esta gente passa dois anos e meio sem ouvir ninguém, a assobiar para o lado como se não fosse nada com eles e agora querem humildemente que os outros partidos e os parceiros sociais colaborem na reforma do estado? Andaram dois anos a espicaçar o PS (verdade seja dita, colocaram-se a jeito) e agora esperam o quê? Tiveram uma UGT que, mesmo superpressionada, assina um acordo de concertação social com patrões e governo e depois é o próprio governo que, ao não cumprir a sua parte, força a UGT a ir para a rua, colocando em risco uma estabilidade social cada vez mais frágil e agora esperam o quê?
Pelo menos podiam ter a feliz ideia de criarem um espaço de discussão pública sobre o assunto... sempre ajudava a disfarçar a demora...




Bem, mas falemos de humildade democrática e, em especial, da que este governo vai precisar demonstrar neste tema. Assumo que o governo está apenas interessado em discutir com PS a reforma do estado. O chamado arco da governabilidade (veremos por quanto tempo mais esta definição é válida...) poderá debater o assunto. PCP e BE estão fora da questão, seja por razões ideológicas profundamente divergentes com o governo seja pela falta de humildade democrática que esses dois partidos tantas vezes demonstram pelos partidos que, tendo milhões de votos a mais que eles, não têm, no seu entender, qualquer legitimidade democrática... Outro tema que analisaremos mais tarde.
Bem, mas então em que ficamos? Qual será o conceito de humildade democrática que o governo vai utilizar na sua atuação e qual seria a adequada? Como bruxo não sou, apenas posso opinar sobre a humildade democrática que o governo deveria assumir. Se realmente se pretende uma verdadeira reforma do Estado, não é procurando consensos com o PS que vão alcançar algo de positivo ou relevante. Pode parecer estranho, mas se o governo (PSD e CDS) se unirem ao PS para promover a reforma do Estado, estamos perante um egocentrismo desmesurado e não humildade democrática.
Se realmente pretendem humildade democrática, a reforma do Estado deveria abranger toda a sociedade civil, em todas as suas múltiplas facetas, porque o Estado é de todos nós e todos nós deveríamos ser chamados a prestar o nosso contributo nesta matéria.
Teremos de responder a duas questões concretas: que Estado pretendemos no futuro e quanto estamos dispostos a pagar por ele.
Se realmente queremos ter humildade democrática, todos teremos de colocar de lado barreiras ideológicas e dogmas pré-concebidos.
Não se pode partir de pressuposto algum se queremos mesmo reformar o Estado: não podemos pensar que este deve ficar mais pequeno ou maior, mais executor ou mais fiscalizador, mais ou menos investidor ou mais ou menos privatizador. Qualquer forma é possível, desde que os Portugueses aceitem as responsabilidades que daí resultarem no futuro.
Por isso se torna fundamental discutir abertamente e sem preconceitos esta temática. No final, veremos quem tem a humildade democrática de assumir a vontade dos portugueses quando dissermos se queremos ou não um Estado diferente.

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