I- POLÍTICAS ORÇAMENTAIS
4 - Despesa pública (seis medidas)
4.1 - Rever e controlar os gastos em todas as áreas da despesa pública (por exemplo, educação, defesa, transportes, administração local, benefícios sociais)
Controlar os gastos não significa cortes cegos. Nós por cá sabemos o que custam esses cortes a todo o custo. Há muito que ainda pode ser cortado, mas cortámos algumas coisas em demasia e que temos de corrigir.
4.2 - Trabalhar no sentido de melhorar drasticamente a eficiência dos departamentos e unidades administrados a nível central ou local segmentação visando os processos orçamentais, reestruturação de gestão e realocação de recursos mal utilizados.
A requalificação e a mobilidade para mim não são tabús e devem ser implementados. Não faz sentido numa mesma localidade estarem funcionários públicos sem nada para fazer quando outros serviços públicos rebentam pelas costuras. Isso vê-se essencialmente nas assistentes operacionais na função pública. Eu não tenho medo de propor a rotatividade entre serviços, como não tenho problemas em considerar que alguns funcionários públicos possam ter um regime móvel, atendendo aos serviços com maiores necessidades num determinado período.
4.3 - Identificar medidas de redução de custos através de análise completa à despesa de cada ministério e da racionalização da despesa não salarial e não relacionada com pensões que, atualmente, representa um espantoso peso de 56% na despesa pública total.
Uma Public Expenditure Review foi o que o FMI fez em 2012 (divulgada em janeiro de 2013), a pedido do governo português, e onde analisou a despesa pública portuguesa tendo acabado por sugerir diversas medidas - que levantaram enorme polémica –para cortar nas pensões e salários entre outras. Tal como em Portugal, também na Grécia os salários e pensões têm um enorme peso na despesa do Estado – 56% no caso grego e 55% no português (dados do OE 2015) – só que o mais natural é que as recomendações de cortes recaiam nestas duas áreas. Foi assim em Portugal. Isto acontece porque há rubricas nas outras despesas onde é mais difícil mexer (juros ou despesas de determinados contratos) e também porque o FMI tende a privilegiar cortes neste tipo de gastos que visam, em simultâneo, reduzir o peso do Estado (funcionários) e contraria o impacto orçamental da pressão demográfica.
Eu quando vejo a despesa dos funcionários públicos também vejo as tarefas que estes desempenham e não olho apenas para as receitas que geram. É preciso continuar a racionalizar, mas isso para mim não é apenas cortar. Estas duas palavras não são sinónimos (embora neste governo assim tenha parecido).
4.4 - Aplicar a legislação (atualmente em fase de projeto no Gabinete de Contas Gerais - GCG) para rever benefícios não salariais no setor público.
A tabela de suplementos única na função pública e a paridade dos índices remuneratórios e dos salários é fundamental. Todos os suplementos injustificados têm de ser cortados. Para mim aqui não há direitos adquiridos nenhuns, há justiça social por fazer. Isto aplica-se a todo o setor do estado, desde a administração central à administração local, passando pela administração regional, institutos públicos, empresas do estado, empresas com capitais ou subsídios e subvenções do estado e instituições do 3.º setor financiadas pelo estado. Sem exceções.
4.5 - Validar benefícios através de controlos cruzados entre autoridades relevantes e de registos (por exemplo, número de contribuinte e de segurança social), o que ajudará a identificar beneficiários não elegíveis.
Ao cruzamento de informação entre a AT e a Segurança Social eu acrescentava o cruzamento de informação bancária (através do Banco de Portugal) e de outros serviços públicos, como o IRN, a saúde, etc..., sempre com parecer prévio da metodologia aplicada devidamente validado pela CNPD.
4.6 - Controlar a despesa de saúde e melhorar a oferta e qualidade dos serviços médicos, ao mesmo tempo que é assegurado o acesso universal. Neste contexto, o governo pretende apresentar propostas concretas em colaboração com as instituições europeias e internacionais, incluindo a OCDE.
A propósito do acesso universal: Este ponto remete para as limitações de acesso aos serviços de saúde desde o arranque dos programas de austeridade, que passaram, entre outras coisas, que os desempregados perdessem esse direito ao fim de XXX meses sem trabalho e que tenham sido feitos inúmeros cortes. Sem ser explícito, esta passagem da carta de Varoufakis visa precisamente esse problema que está a agravar as condições de saúde no país. Um artigo da revista Lancet, publicado no ano passado, alertava para uma “tragédia de saúde pública” relacionada com o agravamento de problemas de saúde mental (com aumento do número de suicídios) mas também progressão de doenças contagiosas como HIV ou tuberculose.
Uma vez mais, este governo atual foi capaz do melhor e do pior num mesmo setor: pagou milhares de milhões de euros de pagamentos em atraso que ameaçavam deixar os hospitais sem medicamentos, renegociou as percentagens usurárias das indústrias farmacêuticas, isentou centenas de milhares de portugueses de taxas moderadoras, liberalizou definitivamente o mercado de genéricos e aumentou as taxas de comparticipação nesses medicamentos, permitindo que os doentes e o estado paguem ambos menos pelos medicamentos. Por outro lado, em vez de terminar com os privilégios da classe médica, impedindo que os médicos que trabalham no setor público a tempo inteiro possam exercer no setor privado e terminando com a vergonha dos números clausus no acesso aos cursos de medicina, andou a cortar em enfermeiros e outros contratados, em despesas correntes e a estrangular as instituições.Não é a história do medicamento da hepatite C, do qual já muito escrevi, que me indigna (pois indigno para mim é termos de pagar 24.000 euros por um medicamento que poderia custar poucas centenas de euros). Não podemos é permitir que continuem a morrer doentes nas macas dos hospitais ou em salas de espera a aguardar serem atendidos. Ao sistema de triagem de Manchester falta acrescentar algo muito simples: bastava que a cada 10 minutos um ou vários enfermeiros(as) fossem ter com os doentes em espera e acompanhassem o seu estado, medindo os sinais vitais e os indícios visíveis da doença. Temos muitos enfermeiros desempregados (ao contrário de médicos, que temos muita falta), e a contratação de algumas centenas de enfermeiros não seria tão onerosa como isso para o estado mas estou convencido que diminuiria para quase zero o número de mortes nas urgências por falta de tratamento.
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